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CARTA DE CONJUNTURA DEZEMBRO DE 2019

por | dez 31, 2019 | Formação Política

UM OLHAR ACERCA DOS ACONTECIMENTOS QUE ATINGEM A DEMOCRACIA, AS FINANÇAS PÚBLICAS, OS DIREITOS DOS TRABALHADORES E DOS SERVIDORES PÚBLICOS.

EM PAUTA

  1. ORÇAMENTO DA UNIÃO APROVADO PARA 2020 AMPLIA DESPESAS COM DÍVIDA PÚBLICA, DESTINA RECURSOS INSUFICIENTES PARA EDUCAÇÃO E SAÚDE E MANTEM BAIXISSIMO INVESTIMENTO DIRETO
  2. MÍDIA FAZ DE CONTA QUE NÃO EXISTE CRISE E SE AGARRA EM INCIPIENTES NÚMEROS DA ECONOMIA PARA BAJULAR GOVERNO FEDERAL
  3. INVESTIGAÇÕES ACERCA DA “RACHADINHA’ EM GABINETE DE FLÁVIO BOLSONARO NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO APROFUNDAM COLETA DE PROVAS ACERCA DOS CRIMES APONTADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

 

I – 2019 vai fechando as portas e país aprofunda submissão ao capital rentista, com mais recursos destinados ao pagamento da dívida pública

A aprovação do orçamento da União para 2020 escancarou a submissão aos dos donos do capital aplicado em títulos do tesouro. Bolsonaro e Paulo Guedes aumentaram imensamente os valores que serão transferidos aos fundos financeiros, de previdência, bancos e não-residentes. Em novembro, conforme imagem abaixo, a Dívida Pública já havia chegado ao patamar mais alto desde 2003, mesmo com os rios de dinheiro pagos em juros e amortizações desde então.

 

Vamos aos números da Dívida Pública previstos no Orçamento para 2020.

Refinanciamento da dívida pública federal: R$ 917.135.052.463,00 (novecentos e dezessete bilhões, cento e trinta e cinco milhões, cinquenta e dois mil, quatrocentos e sessenta e três reais), constantes do Orçamento Fiscal. O refinanciamento equivale ao total da dívida que será trocada por novos títulos, tendo em vista a incapacidade do tesouro nacional em quitá-los nas datas de seus vencimentos.

Os números, segundo a natureza das despesas, retirados do projeto aprovado, conforme se verá abaixo, revelam o montante a ser abocanhado pelo capital aplicado em títulos públicos, sob comando de bancos, fundos financeiros e de previdência, entidades do próprio governo federal e “investidores” não-residentes.

Assim se observa que as despesas com juros serão superiores aos gastos com pessoal e encargos sociais. Já a parcela destinada para amortização é quase 3,5 vezes maior que as mesmas despesas de pessoal. Na prática, desde 1999 no Brasil, o “sistema” da dívida pública transformou-se na modalidade mais segura e agressiva de acumulação e criação de novos valores para o capital, embora permaneçam fatias do capital aplicadas no agronegócio, na indústria e nos serviços não-financeiros.

Dirão os jornalistas de mercado e consultores financeiros, Senadores e Deputados Federais aliados ao “ sistema” da dívida pública, assim como as autoridades da Economia e, quiçá, do Tesouro Nacional e do Banco Central, que esses montantes existem pois o estado gasta mais do que arrecada e, por isso, precisa se financiar emitindo títulos públicos. Esquecem ( na verdade omitem) esses senhores que a causa maior do endividamento é, há décadas, a própria dívida e seus encargos e, para mantê-la sustentável ( rendendo sempre sem risco de calote) aprovaram a Emenda Constitucional 95 /2016 e agora propõem três novas Propostas de Emenda Constitucional ( 186, 187 e 188 ), das quais a 188 é taxativa: A dívida pública passará a ser a âncora fiscal do Estado.

A aprovação dessas PECs no retorno das sessões do Congresso Nacional, a partir de fevereiro de 2020, apenas consolidará a injusta repartição fiscal da riqueza criada pela sociedade e dela subtraída pelo Estado, mediante carga tributária regressiva e indireta. Ao mesmo tempo os recursos destinados para manutenção e desenvolvimento do ensino e às ações e serviços públicos de saúde revelam a contradição dos fins da política fiscal do Estado.

Segundo o texto sugerido pelo Relator do Projeto de Lei Orçamentário para 2020, aprovado ao final da tramitação, “a despesa com manutenção e desenvolvimento do ensino – MDE é de R$ 95,0 bilhões, montante R$ 40,6 bilhões acima do mínimo constitucional (R$54,4 bilhões, de acordo com cálculo fundamentado no art. 110 do ADCT). Para suportar o montante das despesas com MDE, foram destinados R$ 59,0 bilhões de recursos ordinários, R$ 8,8 bilhões do Fundo Social, R$ 4,9 bilhões da Contribuição do Salário-Educação e R$ 22,3 bilhões de outras fontes de recursos. “. Ressalve-se que a arrecadação do salário-educação se refere a uma contribuição social paga pelas empresas sobre sua folha salarial.

Já para as ações e serviços públicos de saúde, “ nos termos do que dispõe o art. 110, inciso II, do ADCT, para o exercício de 2020, a aplicação mínima em Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS) deve corresponder ao valor do mínimo calculado para 2019 corrigido em 3,37% (variação do IPCA no período de julho de 2018 a junho de 2019). Assim, uma vez que o valor mínimo para 2019 alcançou R$ 117,3 bilhões”. Assim, o Substitutivo ao PLOA 2020 deve consignar recursos da ordem de R$ 121,2 bilhões.

Em números conjuntos, portanto, manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE) e ações e serviços públicos de saúde (ASPS) terão R$ 180,2 bilhões em 2020, o que representa apenas 45% (aproximadamente) de tudo que o Orçamento de 2020 terá reservado para pagamento de juros da dívida pública, repito, só para juros. Já em relação ao que o Orçamento prevê para amortização, os recursos de MDE e ASPS representarão apenas 15 %. Uma vergonha para um país que precisa aprovar o Custo-Aluno qualidade, o novo FUNDEB permanente e com ampliação da participação federal no Fundo, além da retomada da luta pela universalização do SUS com equidade e qualidade. Percebe-se, portanto, que nosso problema não é incapacidade fiscal, mas desvio de finalidade na aplicação dos fundos públicos, favorecendo-se o capital improdutivo. Outra comprovação dessa improdutividade desse orçamento reside na dotação para Investimentos diretos: Apenas R$ 40 bilhões. Somados aos investimentos das estatais, chega-se a R$ 121 bilhões, pouco mais de 10% do que está previsto para amortização da dívida. Um autêntico escândalo.

  1. MÍDIA FAZ DE CONTA QUE NÃO EXISTE CRISE E SE AGARRA EM INCIPIENTES NÚMEROS DA ECONOMIA PARA BAJULAR GOVERNO FEDERAL

Chegou a ser patético o esforço de jornalistas de mercado e consultores para turbinar o pífio crescimento de 0,6% estimado para 2019. Não foram poucas as vozes otimistas falando em “retomada” do crescimento, em página virada da recessão etc. Uma vergonha. A mídia econômica segue fazendo o jogo sujo do falso otimismo, manipulando números e ludibriando os desempregados vendendo uma falsa esperança de melhorias para o povo. A aprovação do orçamento de 2020 foi coberta com um festival de trapaças. Destaque gigantesco aos números das despesas de pessoal, aos gastos com bolsa-família. Nenhuma explicação, porém, às baixas dotações para investimentos, assim como uma única tabela sequer mostrada nas televisões referentes às astronômicas cifras aprovadas para a dívida pública, seja para juros, amortizações ou seu refinanciamento, sobre o qual incidirão novos juros. Tal situação reforça a necessidade de se construir urgentemente um esforço sindical e popular de desmascaramento da dívida pública como algo benéfico ao Estado e ao país, revelando-se sua verdadeira face, a face da concentração de riqueza, de aumento das desigualdades.

Da mesma forma se impõe um debate amplo acerca do papel dos meios de comunicação no país, posto que são, rádio e tv, concessões públicas, mas atuam como porta-vozes dos interesses do capital privado.

IIIINVESTIGAÇÕES ACERCA DA “RACHADINHA’ EM GABINETE DE FLÁVIO BOLSONARO NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO APROFUNDAM COLETA DE PROVAS ACERCA DOS CRIMES APONTADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

As investigações acerca dos esquemas de “rachadinha “no gabinete do então Deputado Estadual Flávio Bolsonaro fecham o cerco e, parece, podem chegar ao hoje Senador de forma direta, bem como a assessores e parentes da ex-mulher de Jair Bolsonaro. A mídia morde e assopra, ora dando destaque ora diluindo a matéria nos dias subsequentes à veiculação das primeiras notícias. Mais um motivo para discutir seu papel na sociedade e no combate ao crime organizado na esfera política. Diante dos novos fatos Sérgio Moro parece estar no mundo da lua. Mantém-se calado e omisso, bem diferente dos tempos em que atuava como Juiz em Curitiba. Nenhuma providência para reforçar as investigações contra o filho do chefe e seus assessores. Tudo indica que, caso não haja nenhum acidente de percurso com as investigações, o filho do Presidente está muito perto de ser citado pelo Ministério Público e se tornar réu, caso acatada a denúncia do MP, complicando-se ainda mais a perda acelerada de aprovação do governo Bolsonaro.

Por fim, como afirmamos na CARTA DE NOVEMBRO, enquanto a cena política não põe nas ruas a oposição a Bolsonaro e Paulo Guedes ambos não param de produzir ataques aos direitos dos servidores, trabalhadores e do povo de uma maneira geral. O último deles foi tratar como “privilégios” os ganhos reais dos servidores na média das negociações salariais de 2019, forçando-se uma comparação criminosa com os ganhos dos trabalhadores do setor privado. A capa do “Jornal do Commercio” essa semana cumpriu esse papel de colocar a opinião pública contra os servidores públicos.

Em 2020, como vimos antes, as PECs 186, 187 e 188 vão cumprir o nefasto papel de promover novos ajustes administrativos, fiscais e financeiros a favor dos donos da dívida pública. A agressividade é tamanha que a PEC 188 propõe um novo artigo na Constituição Federal, tornando a dívida pública a âncora fiscal do Estado, algo inexistente na história republicana do país e desconhecido também em qualquer outra nação democrática do mundo.

Para reforçar a crítica ao que propõem Guedes e Bolsonaro lembramos mais uma vez que a primeira das três PECs, chamada PEC EMERGENCIAL, trata de controle à expansão de gastos com pessoal no serviço público, admitindo redução de jornada, redução de 25% do salário, corte de promoções e progressões, suspensão de concursos públicos etc. Como as duas outras, também submete as leis orçamentárias e suas respectivas previsões de gastos à sustentabilidade da dívida pública como proporção do PIB.

A segunda, a PEC dos FUNDOS PÚBLICOS, propõe a revalidação dos atuais fundos sem execução orçamentária através de Projetos de lei complementar, que deverão ser apresentados e votados em até dois anos da promulgação da emenda. Até lá, não sendo renovados os Fundos, os recursos parados no caixa dos mesmos serão usados para o abatimento da dívida pública. A previsão, porém, é que não se conseguirá fazer os projetos de lei complementar pela revalidação dos fundos ora parados e que isso já seria um sinal para se liberar seus recursos para o pagamento da dívida pública.

A terceira PEC, a do NOVO PACTO FEDERATIVO, é a mais grave, pois insere no texto constitucional, ENTRE OUTRAS DISPOSIÇÕES, que a partir da promulgação da emenda a dívida pública passa a ser a “âncora” fiscal do estado brasileiro. Caso aprovada essa proposta seria dado adeus ao Estado de bem-estar social, adeus ao Plano Nacional de Educação, adeus ao SUS e demais direitos sociais. A PEC 188 expressa o mais agudo ataque dos grupos econômicos e financeiros que comandam os grandes valores da dívida pública, de curto prazo de vencimento da maioria de seus papéis, além de prejudicar gravemente o financiamento da educação e da saúde, não bastassem os arrochos provocados pela Emenda Constitucional 95/2016, proposta pelo governo Temer contra o conjunto das políticas sociais em questão.

Com a “soberania” e centralidade da dívida pública na execução dos gastos do tesouro exigir-se-ão mais e mais cortes de gastos não financeiros, gerando-se sacrifícios ainda maiores à população, a paralisação dos investimentos do Estado e a permanência do desemprego recorde de hoje.

O ano de 2020 deve começar, portanto, com um chamado às mobilizações gerais dos trabalhadores dos setores públicos e privados contra tais desmandos. As Centrais sindicais não podem se dividir e fugir dessa luta unitária. Para isso torna-se cada vez importante compreender esses mecanismos, da formação da dívida às engrenagens que lhe alimentam, ao lado da recessão e das decisões econômicas adotadas nesse momento, construindo dessa forma mecanismos sindicais, populares, de comunicação e acadêmicos, visando seu desmonte antes que tais engrenagens acabem com o Estado e a nação.

Considerações finais

Que 2020 seja de luta e unidade da classe trabalhadora para derrotarmos cada medida desse pacotão neoliberal representado pelas três PECs 186,187 e 188 enviadas por Guedes e Bolsonaro ao Congresso Nacional dia 5 de novembro passado.

VI – Sugestões bibliográficas

 

Renovamos aqui as sugestões de acesso da CARTAS anteriores e trazemos novos títulos. Confira as seguintes publicações:

Democracia Econômica, alternativas de gestão social, Ladislau Dowbor, Petrópolis, Editora Vozes, 2008

Desigualdade Econômica no Brasil, Márcio Pochmann, São Paulo, Ideias & Letras,2015

Qual desenvolvimento? Oportunidades e dificuldades do Brasil contemporâneo, Márcio Pochmann, São Paulo, Publisher, 2009.

Capitalismo em crise, política social e direitos, Ivanete Boschetti e outros autores, São Paulo, Cortez Editora, 2010

Economia e Política das finanças públicas no Brasil, Fabricio Augusto de Oliveira, São Paulo, Hucitec, 2009

O Capital e suas metamorfoses, Luiz Gonzaga Belluzzo, São Paulo, Editora UNESP, 2013.

RUPTURA, A Crise da democracia liberal, Manuel Castells, Rio de Janeiro, Zahar, 2018

Governos Lula, Dilma e Temer: Do espetáculo do crescimento ao inferno da recessão e da estagnação (2003-2018), Fabrício Augusto de Oliveira, Rio de Janeiro, Letra Capital, 2019

A Era do Capital Improdutivo, Ladislau Dowbor, São Paulo, Outras Palavras e Autonomia Literária, 2017.

Economia para poucos, Impactos sociais da austeridade e alternativas para o Brasil, Pedro Rossi, Esther Dweck e Ana Luiza Matos de Oliveira, São Paulo, Autonomia Literária, 2018

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