Após pouco mais de um ano vivendo numa pandemia, atravessamos o pior momento no Brasil. Março foi de longe o mês com mais mortes por COVID-19, e especialistas temem um mês de abril ainda pior [1]. No último final de semana ultrapassamos a infeliz marca de 330.000 mortos pela COVID-19 no país, e quase 13.000.000 de contaminados pelo vírus. Em Pernambuco, chegamos à triste marca de 12.300 mortos, e mais de 355.000 casos da doença [2]. São números incontáveis. Nas palavras do poeta, inumeráveis [3]. Em cada vítima, um ser único, com sonhos e planos, com familiares e amigos que hoje lamentam sua precoce perda para o coronavírus.
Conforme dados coletados junto à Secretaria de Gestão de Pessoas – SGP do Tribunal de Justiça de Pernambuco – TJPE, até a primeira quinzena de março 471 (quatrocentos e setenta e um) servidores ativos deste tribunal foram infectados pela COVID-19, podendo haver um número ainda maior em virtude de subnotificações. Destes colegas, lamentavelmente, 4 (quatro) vieram a óbito com causa de morte declarada expressamente como COVID-19, e 2 (dois) casos de morte com suspeita de terem ocorrido em decorrência da doença. Cada colega é muito mais que um número, representa um(a) companheiro(a) de trabalho e de vida, uma amiga, um amigo, dos quais fomos privados do convívio. Somem-se, ainda, colegas aposentados(as), bem como familiares de servidores perdidos. Todos com nome, rosto e voz.
A gestão caótica da pandemia por parte do (des)governo federal, com o quarto ministro da saúde em um ano, as reiteradas recusas às ofertas de vacinas, somada às atitudes irresponsáveis e negacionistas do atual morador do palácio do planalto, com recomendação de tratamento precoce rechaçado pela ciência e incentivo a aglomerações, levaram o Brasil à pior crise sanitária de nossa história. Nos tornamos uma ameaça global e o epicentro da pandemia. Um estudo elaborado pela Faculdade de Saúde Pública da USP e a Conectas Direitos Humanos [4], uma das mais respeitadas organizações de justiça da América Latina, “revelou a existência de uma estratégia institucional de propagação do vírus, promovida pelo Governo brasileiro sob a liderança da Presidência da República”. O estudo revela o que epidemiologistas vêm enfatizando há tempos, “a maioria das mortes seriam evitáveis por meio de uma estratégia de contenção da doença, o que constitui uma violação sem precedentes do direito à vida e do direito à saúde dos brasileiros”. A maioria das mortes eram evitáveis!
Março se foi como o mês mais mortífero da pandemia, e, infelizmente, a tendência é de que a situação continue piorando em abril, haja visto que batemos recordes de mortes diárias já acima de 4 mil vítimas ao dia. O Imperial College de Londres aponta que a taxa de contágio do país atualmente está em 1,12 – a pandemia só recua quando esse número fica abaixo de 1 [5]. O Brasil concentra hoje um terço das mortes diárias por COVID no mundo, mesmo com 3% da população mundial. E as projeções apontam que é bastante provável que o pior cenário se concretize e o Brasil passe de quinhentos mil mortos por covid até o meio do ano.
Além de ter sido o mês mais devastador até aqui, março revelou ainda uma nova face da pandemia, cada vez mais jovem e feroz [6]. Segundo dados da Fiocruz, 48,4% do total de internações em março no país são de pessoas com menos de 60 anos, a maior proporção na pandemia. No Estado de São Paulo, a faixa etária não idosa já corresponde a mais da metade das hospitalizações. Segundo o Observatório Covid-19 BR, o número de infectados entre 15 e 29 anos dobrou em São Paulo de fevereiro para março. No Hospital Emílio Ribas, um dos principais da capital São Paulo, a infectologista Rosana Richtmann garante que ao menos um terço dos internados tem menos de 40 anos. “É uma nova pandemia, diferente do que vimos no ano passado. A nova variante não tem um grupo específico, transmite mais fácil e tem uma virulência mais forte, provocando um aumento muito grande de casos graves entre os jovens”, afirma ela.
“É o pior momento, com o maior número de óbitos e maior número de casos. O que indica que o mês de abril ainda vai ser muito ruim”, disse à AFP a epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) [7]. O período entre 21 e 27 de março foi a semana com mais casos registrados de contágio (quase 540.000) no país, o que significa que, nas próximas semanas, haverá mais pessoas precisando de internação. Os hospitais estão saturados em todo o país, faltam remédios para intubação e oxigênio, alguns estados já adotam protocolos para alocar os leitos disponíveis para pacientes com melhor chance de sobrevivência.
“A pandemia está completamente fora de controle e a possibilidade de atingirmos 4.000 óbitos por dia é muito real já a partir desta semana. E, com isso, a perspectiva de atingirmos um total de meio milhão de óbitos até julho passa a ser muito possível”, acrescentou à AFP o neurocientista Miguel Nicolelis, professor catedrático da universidade Duke (EUA), que coordenou a Comissão Científica formada pelos estados do Nordeste para enfrentar a pandemia.
Em sua coluna no EL PAÍS [8], Nicolelis afirma: “Estamos a poucas semanas de um ponto de não retorno na crise do coronavírus no Brasil”. Ele teme que, além do sistema de saúde, os serviços funerários também entrem em colapso, caso o chamado a um “lockdown nacional” não seja feito. Na capital mais populosa do país, São Paulo, cemitérios passaram a funcionar à noite para dar conta da demanda de sepultamentos. Mesmo assim, o Governo Federal segue rechaçando medidas de restrição nacionais. Neste sábado (3), o atual Ministro da Saúde declarou que “evitar lockdown é a ordem” [9].
Em Pernambuco, dados da Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) apontam que, na noite da sexta-feira santa (2), a ocupação de leitos de UTI-covid era de 96%. Havia 112 pacientes na fila esperando por um leito de UTI [10]. No sábado (3), o Governo do Estado anunciou a abertura de mais 50 leitos de UTI para covid durante a semana. Número ainda insuficiente considerando a atual lista de espera por leitos. Ainda que atravessando o pior momento da pandemia até aqui, com recorde de internações por covid no estado, o Governador Paulo Câmara retrocedeu nas medidas de restrições “mais rígidas”, e implementou desde o 1º de abril um novo plano de convivência com a covid-19, indo na contramão das medidas que a gravidade da situação exige.
Essa é a situação que está posta. A pandemia se agrava a cada dia, a cada estatística divulgada, um novo recorde macabro, não há um plano estratégico nacional de prevenção e combate à covid, não temos vacinas suficientes – tampouco vontade política do Governo Federal de acelerar a vacinação, e não há política de assistência social para garantir o mínimo de dignidade a maior parcela da população nesse período difícil da nossa história.
O SINDJUD-PE, desde o início da pandemia tem se movimentado oficiando o tribunal pela adoção de medidas que resguardem a vida dos servidores e suas famílias, a cada reunião argumentando e alertando a gravidade da situação, com dados atualizados da pandemia e as consequências trágicas na vidas dos servidores, sempre valorizando e se apoiando na ciência ao cobrar do TJPE medidas de cuidados à saúde, na perspectiva de defesa da vida.
Das lutas e cobranças, vieram vitórias. Ainda que tardiamente, no nosso entender, desde o dia 9 de março, pela edição do Ato Conjunto nº 12/2021, mais tarde prorrogado pelo Ato Conjunto nº 16/2021, estamos com todos os servidores em regime de trabalho remoto – à exceção dos oficiais de justiça que estão cumprindo mandados de matérias urgentes, e com a proibição expressa de atividades presenciais, bem como servidores psicólogos, pedagogos e assistentes sociais, que a depender da situação podem atuar presencialmente (nos termos do Ato Conjunto nº 16 e Instrução Normativa nº 7/2020).
Conscientes e preocupados/as com a gravidade do momento, continuaremos atentos/as ao cumprimento dos atos por parte de todos/as que compõem este órgão, e cobraremos do TJPE a manutenção do trabalho remoto enquanto a pandemia não recuar e houver condições seguras para a retomada gradual das atividades presenciais, bem como enquanto não houvermos avançado no programa de vacinação. Só a vacinação e o isolamento social podem salvar vidas.
Mais do que nunca é hora de nos unirmos pela preservação da vida. Afinal, a vida é mais importante que as metas! O SINDJUD-PE defenderá sempre a saúde e condições de trabalho de todos servidores e servidoras, bem como a saúde da população em geral.
Em defesa do SUS e da vida de todas as pessoas!
Vacinação para todas e todos já!
SINDJUD-PE
Gestão Lutar e Vencer!
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1. https://correio.rac.com.br/_conteudo/2021/03/agencias/1080717-brasil-viveu-em-marco-pior-mes-da-pandemia-e-teme-abril-ainda-mais-grave.html
2. https://news.google.com/covid19/map?hl=pt-BR&mid=%2Fm%2F015fr&gl=BR&ceid=BR%3Apt-419
3. https://inumeraveis.com.br/
4. https://brasil.elpais.com/brasil/2021-01-21/pesquisa-revela-que-bolsonaro-executou-uma-estrategia-institucional-de-propagacao-do-virus.html
5. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56607007
6. https://brasil.elpais.com/brasil/2021-03-24/uma-nova-pandemia-mais-feroz-e-mais-jovem-subestimei-o-virus-e-me-ferrei.html
7. https://correio.rac.com.br/_conteudo/2021/03/agencias/1080717-brasil-viveu-em-marco-pior-mes-da-pandemia-e-teme-abril-ainda-mais-grave.html
8. https://brasil.elpais.com/brasil/2021-04-01/brasil-fecha-marco-como-mes-mais-mortifero-da-pandemia-e-politicos-fazem-investida-por-vacinas-fora-do-sus.html
9. https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,queiroga-evitar-lockdown-e-a-ordem-mas-temos-que-fazer-nosso-dever-de-casa,70003669434
10. https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2021/04/03/com-recorde-de-pacientes-internados-pe-anuncia-abertura-de-50-leitos-de-uti-para-covid-em-quatro-cidades.ghtml