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Artigo: A luta pela acessibilidade e inclusão social das pessoas com deficiência

por | set 13, 2021 | Destaque Home, Notícias

Por Pedro Wallisson Feitosa, Coordenador de Previdência, Saúde e Segurança no Trabalho do SINDJUD-PE. Pessoa com deficiência física permanente.

No mês de setembro celebramos e reforçamos a luta pela acessibilidade e inclusão social das pessoas com deficiência. Apesar dos avanços das últimas décadas, os anos recentes mostraram que ainda temos muita luta pela frente!

Esse antagonismo é bem ilustrado pelo melhor desempenho histórico dos nossos atletas nos Jogos Paralímpicos de Tóquio, encerrados no último domingo, enquanto o (dito) ministro da educação dias atrás acusou crianças com deficiência de “atrapalharem” o aprendizado dos demais alunos nas nossas escolas.

O Brasil chegou a Tóquio como uma potência paralímpica. Essa expectativa se confirmou a cada competição, com recordes batidos por nossos atletas, como por exemplo a pernambucana Carol Santiago, que conquistou três medalhas de ouro em Tóquio, totalizando cinco, e encerrou sua participação como a atleta brasileira mulher com mais medalhas em uma única edição de Paralimpíada.

Para fazer um adendo: essas conquistas são frutos de muito treino! E não de “superação”. De rotinas exaustivas de treinamentos, assim como ocorre com qualquer atleta de alto rendimento, tenha ele(a) alguma deficiência ou não. É comum, em tempos de jogos paralímpicos, ouvirmos expressões como “exemplo de superação”, “se ele(a) pode, qual a sua desculpa?”, ou “eu não tenho ‘nada’ e ainda reclamo da vida”. Isso é capacitismo: forma de preconceito que as pessoas com deficiência sofrem quando, de forma explícita ou implícita, são discriminadas ou subestimadas em sua capacidade e aptidão, numa sociedade que considera pessoas sem deficiência “normais”. Não é superação, é treinamento! Precisamos abandonar expressões e visões capacitistas. A deficiência é tão somente uma característica da pessoa, nada mais. As pessoas com deficiência não querem pena, piedade; precisam de acessibilidade e inclusão, que lhes proporcionem a autonomia necessária para uma vida plena em sociedade.

Desde os Jogos Paralímpicos de 2008 o Brasil figura entre os dez maiores medalhistas. Nos Jogos Parapan-Americanos, o país liderou o ranking de medalhas nas últimas quatro edições (2007, 2011, 2015 e 2019). No entanto, o sucesso nas competições contrasta com a política do atual governo federal de cortes no esporte[1], que reduziu em 47% os investimentos para formação e treinamento de atletas para os jogos de Tóquio, comparado aos do Rio em 2016, e reduziu, pela primeira vez desde a sua criação, o orçamento destinado ao Programa Bolsa-Atleta [2]. Esses cortes impactaram com maior gravidade o esporte paralímpico, que recebe cerca de metade do investimento destinado aos atletas sem deficiência [3], num país que tem no esporte um dos principais meios de inclusão social de pessoas com deficiência.

Some-se a isso os retrocessos que as políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência vêm sofrendo no governo Bolsonaro. Desde a extinção do Conade (Conselho dos Direitos das Pessoas com Deficiência), logo no início da gestão, ao corte de 70% no orçamento destinado ao Programa Nacional de Apoio à Saúde da Pessoa com Deficiência (Pronas/PcD) [4], e à perseguição anunciada às pessoas pobres com deficiência sob a falsa justificativa de endurecer as regras para concessão do benefício de prestação continuada [5]. O que se faz na prática é restringir direitos. E esse trabalho o atual governo tem feito com maestria, mostrando sua face mais perturbadora, compatível com políticas segregacionistas e capacitistas, fortemente excludentes.

Por isso as falas do atual ministro da educação não nos causam surpresa. Ao dizer que crianças com deficiência “atrapalham” o aprendizado dos outros alunos, e, depois da repercussão negativa, tentar “explicar” a fala dizendo que nas escolas públicas há crianças com “um grau de deficiência que é impossível a convivência”, o ministro reafirma a política de exclusão de PcDs (pessoas com deficiência) adotada pelo governo de aspirações neofascistas que ele representa.

As recorrentes declarações dele sobre o assunto não são por acaso. Em 2020, o governo editou o Decreto 10.502/2020, que abandona a política de inclusão adotada pelo Brasil e determina a separação de alunos com deficiência. A medida foi muito criticada por especialistas em educação, que a enxergam como um retrocesso de 30 anos nas políticas públicas na área [6]. O decreto foi suspenso pelo STF, que nos últimos dias retomou sua análise. Eis a razão das falas do ministro, evocando suas bases para apoiar uma medida que diz ser mais adequada, apelando para o “direito à liberdade de escolha” dos pais de crianças com deficiência, mas que na verdade representa uma política segregacionista superada em todo o mundo, requentada agora para atender os interesses do mercado.

Ativistas, instituições e a comunidade científica alertam para o que está por trás dessa “Política Nacional de Educação Especial” do governo Bolsonaro: “toda essa discussão em torno do decreto só serve para encobrir o verdadeiro motivo da nova política: tentar recuperar os alunos que as escolas especiais perderam, fazer renascer essas escolas e confundir o pais dizendo que eles têm uma escolha entre a escola especial e a comum, quando na verdade a escola especial não deveria existir há tempos”, afirma Maria Teresa Mantoan, pesquisadora da Universidade Estadual de Campina (Unicamp).

Para a educadora, com essa “nova” política, recursos que antes eram destinados à educação inclusiva passarão para as escolas privadas especializadas. “É tudo uma cortina de fumaça para dar dinheiro público para escolas privadas“, diz.

Ao falar em “educação especial”, o ministro fere o direito à educação inclusiva das pessoas com deficiência garantido pela Constituição Federal, presente em convenções e pactos internacionais aos quais o Brasil aderiu, e reafirmado no Estatuto da Pessoa com Deficiência, que garante a participação social e a igualdade de oportunidades, além de prever a obrigatoriedade do atendimento especial a pessoas com deficiência nas escolas regulares inclusivas. Ou seja, o ministro devia estar preocupado em preparar as escolas para oferecer um atendimento adequado e receber todo tipo de alunos, e não em promover segregação.

A escola é o lugar mais importante no processo de inclusão de pessoas com deficiência. Ao proporcionar a convivência de pessoas diferentes, com ritmos diferentes, necessidades diferentes, todos crescem nesse convívio. Estudos no mundo todo mostram que tanto os estudantes com deficiência aprendem mais, se desenvolvem mais, têm mais autonomia e possibilidade de acesso ao ensino superior e ao mercado de trabalho, quanto os alunos sem deficiência têm melhor desempenho acadêmico e na formação socioemocional, aprendendo a lidar com as diferenças, desenvolvem valores de solidariedade, empatia, respeito e tendem a ser cidadãos combativos contra o preconceito na sociedade [7].

A “nova” política de educação especial apresentada pelo governo é mais uma mentira vendida como solução. Desde a posse, quando a primeira-dama fez um discurso em libras e deu a entender que haveria uma maior atenção às políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência, a mentira e a distância entre discurso e prática são marcas do governo Bolsonaro. Meses depois ele determinou a extinção do Conade e o corte de 70% no orçamento do Pronas/PcD. Ou seja, na propaganda oficial o governo anuncia avanços, mas na prática, coberto pelas cortinas de fumaça constantemente provocadas, retira verbas e restringe direitos de quem mais precisa.

Precisamos avançar, e não retroceder!

A escola é o primeiro e mais importante instrumento de acessibilidade e inclusão social das pessoas com deficiência. Além de tudo, é na escola que as crianças têm o primeiro contato com o esporte. É da escola que podem sair grandes atletas e paratletas, homens e mulheres com potencial esportivo e humano, formadores de uma sociedade mais solidária e inclusiva. As Paralimpíadas de Tóquio reafirmaram: somos uma potência paralímpica! Que o futuro nos reserve novos Daniel Dias, Petrúcio Ferreira e novas Carol Santiago, Beth Gomes. E que sejamos mais!

Eventos como esses mostram para a sociedade que nós, pessoas com deficiência, qualquer que seja ela, não devemos estar segregados, nem precisamos de pena. Precisamos mesmo é de acessibilidade e inclusão social que nos proporcionem autonomia e a possibilidade de desenvolver nossas potencialidades na escola, na faculdade, no mercado de trabalho e NO PÓDIO!

A GENTE NÃO ATRAPALHA, A GENTE GANHA MEDALHA!

SINDJUD-PE
Gestão Lutar e Vencer!

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1. Cf. https://brasil.elpais.com/esportes/jogos-olimpicos/2021-08-07/recorde-de-medalhas-do-brasil-contrasta-com-corte-em-investimento-no-esporte.html
2. Cf. https://esportes.estadao.com.br/noticias/jogos-olimpicos,time-brasil-em-toquio-teve-reducao-inedita-no-orcamento-do-bolsa-atleta,70003790242
3. Cf. https://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-incentivo-ao-esporte-precisa-ir-alem-das-olimpiadas/
4. Cf. https://oglobo.globo.com/brasil/governo-reduz-em-70-verba-de-programa-de-apoio-saude-para-pessoas-com-deficiencia-24718669
5. Cf. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/09/governo-quer-corte-de-r-10-bi-ao-ano-em-beneficio-para-deficientes-e-idosos.shtml
6. Cf. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58347504 e https://www.bbc.com/portuguese/geral-58325250
7. Cf. https://www.correiobraziliense.com.br/euestudante/educacao-basica/2021/08/4946234-o-que-esta-em-jogo-quando-ministro-fala-em-educacao-para-pcds.html

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